Entrevista #6 – Luiz Augusto D’Urso

 

De início, agradeço ao professor Luiz Augusto D’Urso por ter aceitado o convite para responder algumas perguntas e, também, pela conversa enriquecedora. O professor Luiz possui vasto conhecimento no campo do direito digital e é especialista em cibercrimes.

 

Na quinta-feira (04), ele publicou um artigo na Folha de São Paulo intitulado como “Em tempos de cibercrimes”[2], onde afirma que vivemos em tempos de cibercrimes e cita os dois últimos casos de grande repercussão, os quais são: o suposto crime de vazamento de foto de nudez de terceiro, pelo jogador Neymar e a suspeita de invasões de celulares e aplicativos de agentes públicos ligados à Operação Lava Jato.

 

Deste modo, oportuno esclarecer algumas dúvidas acerca deste tema que requer muita atenção, uma vez que este tipo de delito encontra-se cada vez mais presente em nosso cotidiano.

 

Confira a entrevista na íntegra:

 

1 – Professor, uma pergunta simples, mas para que todos possam entender. O que é cibercrime?

Luiz Augusto D’Urso — O Cibercrime é um delito cometido de maneira virtual, utilizando a Internet como meio, ou atacando arquivos ou sistemas digitais/tecnológicos.

 

Esta modalidade de crime conta com um atrativo gigantesco, pois o local para realização destes crimes é virtual, ou seja, não depende da presença física do agente, nem do contato com a vítima, o que gera uma segurança aos cibercriminosos, que não necessitam da utilização de qualquer tipo de violência ou ameaça física, e têm a sensação de que a lei, e sua consequente punição, não os alcançarão, característica chave deste tipo de delito.

 

A falta de conhecimento técnico dos usuários também é motivo da migração dos crimes para o ambiente virtual, pois o crescimento rápido e a quase obrigatoriedade da utilização da rede, fazem com que, muitas vezes, os internautas utilizem a Internet sem preparo nenhum, o que os torna alvos fáceis dos cibercriminosos.

 

2 – O senhor poderia listar alguns exemplos de cibercrimes?

Luiz Augusto D’Urso — A variedade destes delitos, que podem ser cometidos pela Internet, é quase ilimitada, por exemplo: crimes contra a honra (difamação, calúnia e injúria), incitação e apologia a crimes, venda on-line de drogas, sequestro de dados e arquivos confidenciais (com utilização do Ransomware), invasão a dispositivos, pedofilia, furto de dados de acesso (phishing) e de valores bancários, extorsão, vazamento e compartilhamento de fotos de nudez, criação de Fake News, dentre muitos outros.

 

3 – Fui vítima de um cibercrime, o que fazer agora?

Luiz Augusto D’Urso — Deve-se procurar a autoridade policial e principalmente preservar a prova. É importante o acompanhamento do advogado nestes tipos de casos, pois o especialista ajudará a preservar esta prova e acompanhará a vítima quando se for procurar a polícia ou acionar o judiciário.

 

4 – Existem meios de prevenção? Como se proteger de um cibercrime?

Luiz Augusto D’Urso — Um meio de prevenção muito importante, que ainda precisamos implantar, é a tão sonhada Educação Digital. Vivemos na luta constante para a inclusão na grade curricular de todas as escolas, da necessária disciplina de Educação Digital. Assim, poderemos ensinar desde cedo a todas as crianças os riscos na utilização da Internet. Estendendo também os eventos sobre este tema aos pais, que precisam estar atentos aos riscos digitais. Além disso, a orientação para se manter o sistema operacional sempre atualizado e ter cautela com links maliciosos, deve sempre ser lembrada.

 

5 – Segundo um estudo divulgado pela McAfee[1], com relação ao cibercrime, estima-se que os prejuízos mundiais são de US$ 600 bilhões por ano, no Brasil este número chega a US$ 10 bilhões por ano. Inclusive, existem cursos na internet ensinando a operar ferramentas maliciosas e técnicas de invasão, o que demonstra que este tipo de conteúdo é acessível a qualquer pessoa. Na sua opinião, falta legislação específica para o tratamento de cibercrimes?

Luiz Augusto D’Urso —  Não acredito que o problema seja lacunas legislativas. Creio que um investimento no aparelhamento da Polícia Judiciária poderia resultar em uma investigação muito mais célere e eficaz. Alterações no Marco Civil da Internet também são extremamente necessárias, principalmente no tocante ao tempo de guarda de registros e logs de IPs e com relação a concessão destes registros.

 

6 – Com a implementação da LGPD, as empresas terão o dever de comunicar os usuários e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados em caso de incidente de segurança que possa acarretar risco ou dano relevante aos titulares (art. 48 da LGPD). O senhor acredita que esta medida fará com que as empresas invistam mais em meios de segurança?

Luiz Augusto D’Urso — Com certeza. Devido a este controle que será realizado pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados, e do valor elevado das penas, podendo chegar à multa de 50 milhões de reais, acredito que as empresas terão um cuidado muito maior com os dados dos usuários.

 

7 – Para finalizar, a tecnologia tem crescido de modo exponencial, ao mesmo tempo em que o direito digital tem passado por uma grande ascensão. Sob sua concepção, tecnologia e direito podem andar juntos?

Luiz Augusto D’Urso — Devem andar juntos. Os novos problemas irão surgir, como a impressora 3D (que pode imprimir armas), ou os crimes cometidos pela inteligência artificial, até a Internet das Coisas, que pode ser invadida. E o Direito deverá acompanhar de perto estas inovações, para conseguirmos afastar ao máximo a vulnerabilidade e o proveito destas ferramentas pelos cibercriminosos, responsabilizando-os quando necessário.

 


[1] Disponível em: <https://www.mcafee.com/enterprise/pt-br/assets/executive-summaries/es-economic-impact-cybercrime.pdf>.

 

[2] Artigo disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2019/09/em-tempos-de-cibercrimes.shtml > e < https://jus.com.br/artigos/76333/em-tempos-de-cibercrimes>.

 


Luiz Augusto Filizzola D’UrsoAdvogado especialista em Cibercrimes, Professor de Direito Digital no MBA de Marketing Digital da FGV, Coordenador e Professor do Curso de Direito Digital e Cibercrimes da FMU, Presidente da Comissão Nacional de Estudos dos Cibercrimes da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (ABRACRIM), Pós-Graduado pela Universidade de Castilla-La Mancha (Espanha), pela Faculdade de Direito de Coimbra (Portugal), pelo Instituto de Direito Damásio e pela Faculdade Ibmec São Paulo e integra o escritório de advocacia D’Urso e Borges Advogados Associados.